Dez especialistas abordaram a questão da Demência e Cuidados Paliativos
29 October 2018 | Social, Idosos, Educação e Formação, Eventos
Pela sétima vez, a Fundação ADFP de Miranda do Corvo promoveu uma conferência sobre envelhecimento, desta vez sobre Demência e Cuidados Paliativos, convidando dez especialistas da área, no auditório do Hotel Parque Serra da Lousã, que se revelou pequeno para tantos interessado.
Segundo OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), Portugal é o 4º país com mais casos de demência por cada mil habitantes. A média da OCDE é de 14.8 casos por mil habitantes, sendo que para Portugal a estimativa é de 19.9. A estimativa futura é de 205 mil pessoas com demência em Portugal, número que subirá para os 322 mil casos até 2037 e em relação aos cuidados paliativos, com base nos dados do INE (Instituto Nacional de Estatísticas) para o ano de 2014: “69 a 82% dos doentes falecidos teriam tido necessidade de cuidados paliativos, o que significa que em Portugal existirão entre 72mil a 85mil doentes com necessidades paliativas”.
Diana Duro, psicóloga do CHUC, abordou a Demência desde a investigação à prática clínica, do impacto global, do défice cognitivo ligeiro, de maior prevalência em mulheres (60%), entre 1995 e 2015, no CHUC, da sua progressividade, da pseudo-demência; João Apóstolo, da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, incidiu a sua palestra sobre a importância da Avaliação geriátrica multidimensional.
A intervenção de Patrícia Paquete, terapeuta ocupacional da Humanamente, despertou a atenção da plateia, ao falar da abordagem centrada na demência, citando Dawn Brooker (2007):“É preciso valorizar a pessoa com demência e quem lhe presta cuidados deve tratar as pessoas como indivíduos; ver o mundo pelo ponto de vista da pessoa com demência e criar um ambiente social positivo onde a pessoa com demência possa usufruir de bem-estar”.
No retrato nacional da demência, Patrícia Paquete falou da falta de recursos humanos, falta de condições para trabalhar, de tempo, atitude negativa em relação às pessoas com demência, da promoção da dependência e utilização de contenção, de instituições demasiado grandes e das muitas pessoas com grande dependência nas instituições. Por fim, citou Tom Kitwood: “Estar presente, implica largara obsessão com fazer, que muitas vezes arruína o ato de cuidar e é ter a capacidade de apenas estar”.
Susana Henriques, Diretora Técnica e Diretora de Serviços da IPSS Cediara abordou os programas de estimulação cognitiva no transtorno neuro-cognitivo, a começar pelo ligeiro, lançando a questão: será possível evitar o envelhecimento do cérebro? “O cérebro pesa 1,4 kg, produz 20 watts, representa 20% da energia corporal,175 mil km de fios de condução, 10 triliões de sinapses e 86 biliões de neurónios”. À pergunta será que o cérebro tem o mesmo desempenho em todas as etapas da vida? No nascimento pesa 300 a 400 gr, na idade adulta atinge 1,4 kg, podendo perder durante o envelhecimento 10 a 20% no fim de vida (90 anos).
Finalmente, Isabel Gil, professora da Escola Superior de Enfermagem, abordou o programa de reminiscência para intervenção em pessoas com compromisso. Primeiro com dados da OCDE de 2017, em que a prevalência da demência era de 14,8/1000 habitantes, sendo a valor mais elevado no Japão (23,3/1000), e Portugal o 4º, atrás da Itália e Alemanha, com 19,9/1000.
Mais, “a perspetiva é que o nº de pessoas com demência triplique até 2050, passando dos 50 milhões para 152 milhões”, afirmou.
Maria do Rosário Zincke membro da direção da Alzheimer Portugal, abordou a delicada questão dos direitos das pessoas com demência, e enquadrou o desafio: “Respeitar os direitos e promover a autonomia das pessoas com demência”.
E quais são? “Receber ou recusar cuidados ou intervenções de saúde, privacidade na prestação de cuidados, confidencialidade, conhecer o diagnóstico, decidir o dia-a-dia e o futuro, incluindo o planeamento e a participação na implementação dos cuidados e a participação ativa na sociedade”.
No âmbito dos Cuidados Paliativos, Marília Dourado, professora na FMUC, falou do controlo de sintomas em Cuidados Paliativos, com uma abordagem global da doença e do doente e em que a família/cuidadores são igualmente objeto de cuidado e atenção, desde o tratamento da pessoa ao suporte à família, da promoção da qualidade de vida até à afirmação de vida.
“É preciso permitir que a pessoa viva o melhor possível até ao fim com a maior qualidade e felicidade: mais vida aos dias e não mais dias à vida”, acrescenta.
Quanto à medicina paliativa, Marília Dourado referiu que “usa técnicas que aumentam o conforto, mas que não interferem na sobrevivência” e está voltada “para o alívio dos sintomas, da angústia e do sofrimento”.
“O foco – conclui – na pessoa, e não na doença”.
Enfermeira no IPO de Coimbra, Ana Rocha falou das medidas de higiene e conforto em Cuidados Paliativos, definindo conforto como “sensação de tranquilidade física e bem-estar corporal, consolar alguém nos momentos de necessidade; imagem mental de se sentir bem, de equilíbrio, contentamento, amabilidade, alegria e conforto, usualmente demonstrada por tranquilidade consigo próprio e abertura para as outras pessoas ou satisfação com independência”.
“Conforto é mas do que desconforto, é construído pelo profissional que cuida, mas determinado ou dirigido pelo doente que é cuidado”, acrescentou.
Liliana Henriques, enfermeira da UCCLM da Stª Casa da Misericórdia de Pedrógão Grande, abordou o Método de Cuidado Humanitude: um contributo para a transformação dos cuidados em saúde.
O sucesso dessa metodologia deve-se – afirma - a Filosofia e 150 técnicas, e a Humanitude é desenvolvida por cuidadores para cuidadores, uma filosofia Humanista centrada na relação entre cuidador e pessoa cuidada”.
“Melhorar, manter e acompanhar até à morte, é o objetivo de um cuidador, que é pessoa (profissional ou familiar) que cuida de uma pessoa com problemas ou preocupações de saúde”, acrescenta. “E será que estamos no nível de cuidado certo? Nem por isso, já que quase 9 em cada dez das pessoas cuidadas não estão no melhor nível de cuidados”, referiu ainda, definindo o que é a Filosofia de Cuidado Humanitude: “não podemos reduzir o ser humano a necessidades…temos de passar de uma filosofia de necessidades a uma filosofia de desejos…e de relações”.
“Demências em contexto de urgência”, temática de Florbela Gonçalves, médica IPO Francisco Gentil, E.P.E. – Coimbra, após falar da síndrome demencial (declínio progressivo de duas ou mais áreas da cognição, com interferência nas atividades sociais, trabalho ou relacionamento inter-pessoal, na ausência de delírio ou outro transtorno psiquiátrico maior), referiu que, “ao contrário da demência, o delírio tem um início abrupto, curso flutuante, memória recente em geral preservada e alteração do nível de consciência”.
Florbela Gonçalves, médica do IPO - Coimbra deu também números reais“ Em 2015 havia 46,8 milhões de doentes com demência no mundo, estimando-se que em cada ano haja 9,9 milhões de novos casos diagnosticados, isto é, uma em cada 3 segundos, mas com uma previsão de 13 milhões em 2050”, sendo a esperança média de vida é de 8 anos desde o início da demência, salientou.
Já Manuel Luís Capelas, professor da Universidade Católica de Lisboa falou dos cuidados paliativos numa sociedade envelhecida – uma emergência de saúde pública”, começando por alguns dados demográficos: “Na União Europeia a esperança média de vida é de 65 ou mais anos, no Mundo é de 80 ou mais”. “O direito à informação, direito ao consentimento, e o direito à liberdade de escolha do doente são princípios fundamentais”, afirma, e quanto aos cuidados paliativos, distinguem-se os compreensivos, os integrados, a qualidade, a acessibilidade universal e os valores de compaixão e comprometimento em cuidar de pessoas frágeis e vulneráveis (doentes, família e cuidadores)”.
Finalmente, Manuel Teixeira Veríssimo, médico do CHUC, fez um balanço, salientando a necessidade dos cuidados paliativos das demências, nas emergências e urgências, em doenças incuráveis, sublinhando que os cuidados paliativos agora são mais caros mas também mais eficientes.
Na sessão de encerramento, Avelino Pedroso, da ARS, após referir que o envelhecimento vai agravar-se cada vez mais, considerou que a sociedade e os serviços de Saúde não estão preparados para isso, e falou da necessidade de reforçar o envolvimento das UCCS, ou do apoio psicológico que é necessário dar ao cuidador, exausto, em casa, isto é dar ao apoio domiciliário um apoio mais integrado.
Numa breve intervenção final, Jaime Ramos, o presidente do CA da Fundação ADFP, que agradeceu a presença de todos nesta conferência, revelou que o Hospital Compaixão será inaugurado em 2019, sublinhando que “o seu funcionamento só é possível se o Estado colaborar”.