O autor do livro «O atraso Português: modo de ser ou modo de estar?» esteve no auditório do Cinema de Miranda do Corvo, como palestrante numa sessão de formação e reflexão sobre o passado, presente e futuro de Portugal.
05 May 2023 | Social, Cultura, Educação e Formação, Visitas, Eventos, Fundação ADFP
O filósofo João Maurício Brás, doutorado em Filosofia pela Universidade Nova de Lisboa e investigador no CLEPUL - Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias, da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tem publicado ensaios sobre as razões porque somos um povo empobrecido relativamente a outros com melhor qualidade de vida
A sessão foi presidida pelo Médico e Presidente do Conselho de Administração da Fundação ADFP, Jaime Ramos.
João Maurício Brás, autor do livro “O atraso Português: modo de ser ou modo de estar? “, respondeu a esta pergunta através de inúmeras reflexões, tendo havido uma participação ativa da audiência.
“Quase 50% da população portuguesa vive naquilo que se chama o limiar da miséria, da pobreza, valor este que, graças às transferências sociais, aos rendimentos ou apoios sociais, reduz depois para 18%, ou seja, quase 2 milhões de pessoas vivem numa situação de vida que não é vida!”, reiterou o filósofo.
“Mais assustador é sabermos que a previsão é de que já em 2024 a Roménia ultrapasse Portugal no PIB per capita. De 2016 a 2024, entre altos e baixos, Portugal convergirá somente um ponto percentual com a média europeia. E a Roménia? Mais de 20 pontos. No que respeita a Portugal, o valor do PIB per capita expresso em paridade do poder de compra foi 77% da média comunitária em 2022, tendo sido o sexto mais baixo da Zona Euro a par da Roménia e da Hungria. Mais ainda: quando um alemão ganha 100 euros, nós só estamos a ganhar 74. “
Em Portugal, em 2021, cerca 40% das pessoas que declararam IRS declararam menos de 10 mil euros anuais. Por isto e muito mais é que Portugal é dos países da Europa onde os filhos estão até mais tarde em casa dos pais.”
“Para além disso, infelizmente outro facto: Portugal é dos países que menos produz. Nós não somos considerados produtivos. Porque é que quando vamos lá para fora, quando emigramos somos bons, somos elogiados? Reparem que entre 2011 e 2021 10% dos portugueses foram embora, quer isto dizer que, 1 milhão de portugueses emigrou, muitos jovens foram embora simplesmente. Isto dá que pensar. “
Portugal tinha, durante as descobertas, um sistema de organização que funcionava em todo lado, nós fomos percursores da globalização. Infelizmente, tudo isso se foi esfumando.”, refletiu também o filósofo.
Outra dos assuntos que levou a uma participação da audiência presente no debate, foi ainda a descentralização e a fomentação de uma vida ativa e participativa na sociedade: “Todos sabemos que, infelizmente, o poder central está tudo em Lisboa. Não há descentralização. Não há mobilização. Não há capacitação. A centralização do poder é, infelizmente, comparável ao absolutismo monárquico. Claro que nem todo o estado é mau, há é um excesso de mau estado.
João Maurício Brás afirmou que “para haver democracia não basta haver instituições, não basta haver escolas. Cada um de nós deve ter um sentido crítico, participar civicamente na sociedade.”
Com inúmeras referências a Antero de Quental, João Maurício Brás salientou ainda que “Uma causa do nosso atraso português, na opinião de Antero de Quental, se deve ao atraso científico e do conhecimento. Portugal vivia isolado de tudo, e esta questão do isolamento foi muito prejudicial para nós.” Relativamente á comunicação social rebordou que apenas no início da década de 90 se consolidou o nascimento de rádios e dos canais privados de televisão.
Como filósofo que é, João Maurício Brás explicou o significado de política e incentivou ainda que “Temos que participar. Temos que exigir. Temos que agir, opinar. O problema é que nós não somos educados nessa tradição. Temos que imponderar as pessoas, adquirir um ideal iluminista. Política vem do grego polis, portanto qualquer um de nós pode ser político. Fazer política é intervir na sociedade. “
Na sua intervenção alertou para o facto de que, as mudanças não se fazem por decretos. E esse é um dos problemas estruturais de Portugal.
E perguntou: “os partidos são necessários, mas até que ponto o excesso de partidocracia não pode sufocar a democracia?”
O filósofo natural de Sines, terminou com algumas observações que deram que pensar e falar, tais como “A questão da identidade do que somos enquanto povo e enquanto país, é também o que queremos ser e do que temos de fazer para chegar aonde queremos, a nossa identidade não é apenas aquilo que fomos, o nosso passado. É óbvio que nem todo o passado é mau, e também nem todo o futuro é bom.
Já um filósofo holandês disse há alguns anos também que «A vida é o que acontece enquanto a gente está a pensar nisso.»
Quem sou eu? Eu sou aquilo que eu quiser ser.”
Conhecido por ser “crítico mordaz” da pós-modernidade, o professor considerou ainda que “O problema da pós-modernidade é uma questão de equilíbrio, neste caso, da falta dele.”
O palestrante teve a oportunidade da parte da manhã de visitar as valências sociais e sede da Fundação ADFP, bem como a Adega, e o Hotel Parque Serra da Lousã, seguindo-se uma degustação daquilo que de melhor se pode provar em Miranda do Corvo, no Restaurante “Museu da Chanfana”, e uma posterior visita guiada pelo Presidente da ADFP, Jaime Ramos, ao Museu Vivo de Artes e Ofícios Tradicionais, Ecomuseu Espaço da Mente, e Templo Ecuménico Universalista.
A sessão terminou com a oferta pelo Dr. Jaime Ramos, de alguns livros da coleção da Fundação ADFP e do seu livro “Não basta mudar as moscas …”, e ainda de duas garrafas dos vinhos “Rabarrabos” e “Monte Isidro”, produzidos pela instituição.